Está debaixo
dos nossos narizes o quanto estamos consumindo pessoas como coisas e as
descartando como coisas, a alienação do dia a dia parece não nos deixar
enxergar que isso acontece, e no caso da dominação masculina, essa objetificação
ganha conotações graves.
Portanto
hoje, me recuso a falar de sexo, seja on-line, seja off-line.
No Brasil,
que por causa do carnaval (o da tv) todos pensam ser um país liberal, é na
realidade um paraíso de ignorância, hipocrisia e machismo. Se nas praias da
Espanha uma mulher pode fazer um topless sem ser incomodada, aqui é quase
impossível, porque os machos das cavernas simplesmente a não deixariam em paz. E
se a moça reclamasse, ainda diriam que a culpa é dela por ficar com os seios a
mostra.
Cheios de
espertinhos de qualquer idade querendo embebedar qualquer moça com a finalidade
de diminuir sua capacidade de decidir, e finalmente tentar estupra-la. E quando
finalmente alguém reclama, novamente, faz-se o possível para transferir a
responsabilidade para a vítima.
Os paizões
de família ameaçam quem quer que sejam de se aproximarem de suas filhas, porque
no fundo sabem, por experiência própria muitas vezes, do que os machos são
capazes de fazer.
Os
hipócritas semeiam machismo e a cultura do estupro e são os primeiros a
aparecer com suas varinhas de condão achando que vão resolver o problema (do
qual fazem parte) com uma simples assinatura num pedaço de papel. Mas quando se
cobram destes que deixem de agir como agem, eles se vitimizam e dizem que o
mundo está chato.
Tinha um
clube aqui na cidade que tinha um corredor. Os homens ficavam encostados na
parede, e qualquer moça que passasse ali era uma presa a ser agarrada, fora o
assédio. Isso era contado com orgulho pelos frequentadores: “Agarrei tantas
minas hoje”.
[Se você pensou: “ah, mas ela sabia que se
passasse ali, isso ia acontecer”, é porque ainda não entendeu.]
Sem contar festas
que permitem a entrada de mulheres com bebida gratuita, e depois de certo
horário abrem-se as portas para os machos. Ora, ora, o que se deseja com uma
coisa destas? Porque simplesmente não deixa as mesmas regras da casa para ambos
os sexos, preços de entrada inclusive, e pronto? Qual o objetivo de embebedar a
mulherada?
Falando em
clubes, alguns prostíbulos têm feitos festas chamadas de “noite do rodízio”. Num
rodízio de carnes ou de massas, garçons vão trazendo diferentes alimentos para
você escolher se quer comer ou não. Pois bem, no rodízio de mulheres você paga
um valor fixo de entrada, escolha quais quer, faz sexo, escolhe outra, faz sexo...
enquanto aguentar ou até a casa encerrar as atividades do dia.
Não é muito
diferente dos cardápios online para escolher uma mulher para passar a noite. Em
ambos os casos existe uma relação entre humanos, e sim entre consumidor e
produto.
Eu queria
ser imparcial, juro que queria, mas não consigo enxergar benefícios nisso.
Porque uma vez que isso entre em nossas vidas e se torna um vício, vamos
precisar de doses maiores, porque a satisfação da dose inicial nunca será a
mesma.
[Vejo uma tragédia poética nessa questão do
vício. Aquilo que nos satisfaz é exatamente aquilo que pode nos arruinar.]
P.S. Sendo
homem, ao fazermos uma reflexão sobre este assunto, temos que fazê-los não sob
um pedestal, mas fazê-lo diante do espelho, tentando encontrar em nós mesmos as
falhas que apontamos no outro.
Saudações, de seu leitor.
Este post é uma
resposta para uma das cartas que Zygmunt Bauman publicou
na revista italiana La Repubblica delle Donne
entre 2008 e 2009, que depois foram reunidas e editadas para o livro 44 Cartas ao Mundo Líquido Moderno (Zahar).
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