Faz tempo que gosto de escrever, provavelmente desde quando
aprendi, lá no antigo primário.
Quando a professora passava algum exercício de redação,
geralmente a minha era das que mais tinham páginas. Lembro de uma vez na quarta
série, quando nos sentávamos em dupla, e cada um tinha que fazer uma redação,
mas quem ia avaliar era a pessoa que se sentava ao lado. A mocinha do lado,
pobre Flávia, ficou revoltada com meu texto com mais de seis páginas e se
recusou a ler. Desde esse dia, a professora resolveu delimitar uma quantidade
máxima de páginas para os exercícios de redação.
Os anos passaram, e eu sempre tinha meus cadernos onde
escrevia algo: um poema, um pensamento, uma frase bonita que alguém falou ou o
eterno começo do próximo livro.
Veio o computador e parecia que seria mais fácil ainda
traduzir os pensamentos em caracteres na tela, através de um teclado. Do bloco
de notas, ao word até chegar nas caixas de texto dos blogs, foram mais muitos
textos sobre tudo quanto é tipo de coisa. Vários blogs e vários fracassos. Ou
não sei, talvez eu seja muito exigente comigo mesmo?
Mas avançando o pensamento, lembrei-me de um dia que um
amigo me disse que tinha dificuldade de escrever. Eu olhei para ele com certa
estranheza, porque para mim, colocar na folha em branco o que me vem à cabeça
sempre me pareceu algo natural, fluído. Mas, não faz muito tempo, eu quis
tentar escrever algo, qualquer coisa, e nada me vinha. Eu tinha as ideias, sabia
o que dizer se precisasse, mas não conseguia organizá-las. E aí me veio essa
lembrança desse amigo de novo, e parece que compreendi sua dificuldade.
Entretanto, ao compreender a dificuldade, talvez genética,
dele, e a minha dificuldade momentânea, percebi o quanto de fato não é tão
simples assim sair borrando o papel com algo que faça algum sentido, que tenha
começo, meio e fim.
Tudo bem, nas boas escolas os alunos têm suas aulas de
redação, e qualquer técnica pode ser aprendida por qualquer um, e isso não me
faz especial de modo algum. Dada essa aula de humildade, gostaria de salientar
que a questão não é ser especial ou não, mas sim eu identificar que existe algo
que goste de fazer, e que de alguma maneira talvez saiba fazê-lo. Posso não ser
um sucesso de crítica, e que se avaliado por qualquer crítico literário, este
possa certamente parar de ler no segundo parágrafo, com o indicador empurrar las
gafas na face, erguer o pescoço levemente, fechar os olhos por um, dois,
três segundos e me dar um tiro de flecha envenenada com seus olhos de harpia
enfurecida, e por dentro se perguntar “MAS QUE MERDA É ESSA?!!!” mas por fora,
dar um sorriso debochado e concluir com comiseração “ficou bom, mas poderia
melhorar aqui, aqui, aqui ...”.
Ou seja, uma bosta igual.
Mesmo diante de todo esse cenário cruel, porém, é
gratificante o processo. Não sei onde li, mas escrever tem mesmo esse toque de
ourivesaria, de trabalhar bem as palavras, de apagar umas, de melhorar outras,
de trocar um verbo, de buscar uma palavra que ainda não foi usada, de evitar
certas repetições, de olhar para um parágrafo gigante e fatiá-lo em pedaços, de
reordenar frases, jogar o meio para o começo e o fim para o meio e sumir com o
final. Essa busca pela melhor forma de se expressar, pode demonstrar uma certa
vacilação, mas faz parte do processo. Dizem que o papel aceita qualquer coisa,
entretanto quem escreve provavelmente não aceita dizer qualquer coisa _ bom, em
tese não deveria.
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