Crônica de uma morte anunciada


Gabriel García Márquez

Obra original publicada em 1981.

Editora Record, 60ª edição.

Enredo

Santiago Nasar foi assassinado a facadas em frente à sua casa, pelos gêmeos Pedro e Pablo Vicário, que alegaram defesa da honra da irmã, Angela, que o acusou de ter tirado sua virgindade. Tal fato foi descoberto por seu marido na noite de núpcias, apenas cinco horas depois do casamento, e o assassinato se deu na manhã seguinte.

O fim trágico de Santiago fica claro logo na primeira frase do livro: “No dia em que iam matá-lo”. Daí em diante, em cinco capítulos, cada um com foco em certos personagens, ele vai e volta na história, elucidando os fatos e mostrando a participação destes e do povoado na história.

Estilo

É uma obra tem um estilo jornalístico e policial.

Apesar de parecer que o narrador é um jornalista, ele atua também como investigador, uma vez que faz entrevistas entre as pessoas do povoado, muitos anos depois do ocorrido _ uma espécie de arquivo-morto (cold case).

Mesmo que todos saibam os fatos principais: quem matou e quem morreu, o narrador parece buscar entender como tudo aquilo aconteceu, como foi possível um crime desse tipo a céu aberto, diante de toda a cidade, e mais, com o conhecimento de muita gente do que estava prestes a acontecer.

No meio dessa investigação, inclusive, fica a dúvida se de fato Santiago Nasar teria violado a virgindade de Angela, ou se ela teria inventado que foi ele o culpado, para proteger algum outro homem.

Narrador

O narrador é um personagem na história, ele ativamente busca informações para escrever sua crônica, e para isso ele volta ao povoado mais de 20 anos depois, em busca de arquivos e para entrevistar pessoas que continuaram a viver por lá e que poderiam contribuir em algo. Como ele também viveu no povoado e estava presente no dia do assassinato, ele também recorre as suas próprias lembranças da época.

Onde e quando

A história se passa em algum povoado na Colômbia. Como o autor menciona o porto, as bananeiras e a cidade de Riohacha, parece que remete ao norte do país, no mar do Caribe _ próximo inclusive de sua cidade natal, Cartagena das Índias.

De acordo com uma das pesquisas que fiz, Gabo teria afirmado que a história se baseia em fatos ocorridos nos anos 1950, na cidade de Sucre, norte da Colômbia. No livro, o autor não fala em qual época a história se passa, mas alguns elementos apontam que se passa em torno dos anos de 1940 a 1950.

Uma das evidências disso são as armas que ele menciona no início do texto (Magnum, .22 hornet, o rifle Mannlincher), e também ao carro Ford T, todos fabricadas nas primeiras décadas do século XX.

Ele também menciona a comunidade libanesa, que eram chamados de turcos, dado que o país ainda era parte do Império Otomano, que imigrou ao país no final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX. Muitos libaneses se fixaram na cidade de Maicao, também ao norte da Colômbia. Inclusive, o personagem principal, que era da comunidade “turca”, era da terceira geração da família que imigrara ao país.

Marquezverso

Na obra também podemos falar sobre um “Marquezverso”, para entrar no modismo, uma vez que o autor faz uma menção ao coronel Aureliano Buendía e Gerineldo Márquez, ambos do romance Cem Anos de Solidão.

Realismo mágico

Se o autor é conhecido por tal estilo, faz sentido procurarmos por elementos sobrenaturais rodando a obra.

Bom, só o fato de ele ter citado personagens de “Cem Anos de Solidão”, já seria evidência suficiente para dizermos que a obra possui tais elementos, porque a obra referida se passa num local imaginário.

Num dos capítulos, o narrador fala de itens que estavam sumindo da casa dos Xius, e que o mistério foi resolvido quando o coronel Lázaro Aponte falou com a alma da falecida Yolanda, em um missa espírita, e que ela é quem estava recuperando tais itens. Inclusive, o viúvo relatou ter visto um pássaro fosforescente sobre sua casa antiga, e julgava ser sua esposa _ e era.

Temas

Um dos temas que se destaca, é o tal crime de honra. Nesse crime, uma pessoa de uma família é assassinada por ter praticado um ato imoral e que atenta contra a honra de uma comunidade ou religião. A Human Rights Watch define que é um crime cometido por uma família do sexo masculino, contra a do sexo feminino _ ainda admitindo que alguém do sexo masculino possa ser vítima. Nos dias atuais, tais crimes são mais comuns em países de cultura islâmica.

A origem desses crimes vem da época dos romanos, onde os homens tinham total poder sobre a vida das mulheres. Qualquer tipo de desonra ao homem, condenava as mulheres a morte.

Com a contínua reprodução do machismo na sociedade, tal prática se não é exatamente a mesma do passado, ainda visa manter a dominação do homem sobre a mulher por meio da violência.

Uma das formas, é a tese da legítima defesa da honra (masculina), em que homens se sentem no direito de matar ou espancar “suas” mulheres, porque estas de alguma forma fizeram algo que lhes ofende moralmente, como colocar-lhes um par de chifres. E seria óbvio dizer, ainda que a traição seja algo lamentável, não há nada que justifique um espancamento ou assassinato. A única defesa de honra possível é a separação, e talvez uns xingamentos nas redes sociais...

No texto, assim como na vida, os autores do crime se disseram inocentes:

(...) “o pároco recordava a rendição como um ato de grande dignidade.

- Matámo-lo em consciência - disse Pedro Vicario -, mas estamos inocentes.

- Diante de Deus talvez - disse o padre Amador.

- Diante de Deus e dos homens - disse Pablo Vicario. - Foi um caso de honra”

Interessante notar, que os autores não pareciam querer cometer o crime. Agiram de forma desleixada, sem tentar se esconder, enchendo a cara. Mas tampouco ninguém os impediu de agirem de forma enérgica. Só a ameaça que fizeram com as facas que carregavam, com o motivo que alegavam, era suficiente para serem presos.

Interessante também notar, um certo clima de conformismo entre várias das pessoas do povoado, que apenas aguardavam a consumação do fato com alguma ansiedade.

A morte de Santiago fora anunciada, o povoado todo sabia, e ninguém impediu.

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