“A Fortuna se manifesta onde não há resistência organizada." (Cap XXV - O Príncipe)
Para mim esta é sem dúvida uma das frases mais importantes
da obra O Príncipe (1513), do florentino Nicolau Maquiável (1469 – 1527).
Uma das grandes preocupações de Maquiavel é com os efeitos
da Fortuna, que podemos chamar de acaso. Ele vai dizer que é inevitável
escaparmos do acaso, mas, o bom príncipe, o príncipe que tem Virtú, é aquele
que é capaz de dentro do seu livre-arbítrio tomar medidas que minimizem o
máximo possível os efeitos do acaso.
Virtú não tem a ver com virtude moral, virtú são competências
requeridas de um líder para manter seu poder como sabedoria, disciplina, senso
de organização, etc.
Imagine que você mora numa casa com um telhado de uma
estrutura bem fraquinha, que serve apenas para reter os raios do sol. Quando
uma chuva forte chegar _ e sabemos que a chuva é um fenômeno da natureza que não
pode ser evitado _ vai destruir seu telhadinho. Se depois dessa chuva você construir
um telhado com estrutura mais forte, estará tentando minimizar os efeitos do acaso, neste caso, que uma chuva forte cause tantos danos quanto outrora.
Vamos a outro exemplo.
SPOILER
ALERT (3º Temporada de Game of Thrones)
Os Starks sob o comando de Robb enfrentaram os Lannisters e
inicialmente se deram muito bem com vitórias em várias campanhas. Mas havia ali
um problema. O exército dos Starks sozinho não era suficiente para enfrentar os
Lannisters de igual para igual, por isso ele teve de fazer alianças no Norte, e
entre estes aliados estavam as famílias Bolton e Frey.
Quando se conta com aliados tão fortes ou mais fortes que o
seu próprio exército, corre-se o risco de ficar na mão deles ganhando ou
perdendo a batalha. Se estes aliados não forem leais e se forem facilmente
corruptíveis, podem tentar um golpe para tomar o poder ou mesmo se vender para quem pagar mais.

[Não posso deixar de anotar que Robb se prejudicou ao não se
casar com uma das filhas de Walder Frey, deixando-o puto da vida, e com razão.
Mas eu tenho comigo que ele o trairia pelo dinheiro dos Lannister de qualquer
jeito].
Maquiavel diz que forças auxiliares e mercenárias são perigosas, inúteis, ambiciosas, indisciplinadas, desleais e covardes. Só. Eles não tem amor pelo príncipe, por isso nada lhe devem, seu interesse é apenas o soldo, e quem paga melhor leva!
Se os Starks tivessem um exército todo deles mesmos, sem
precisar depender de aliados _ que se provaram verdadeiros mercenários _ teriam
tido muito mais chances de derrotar seus inimigos. (Ou se Robb não tivesse matado o líder dos Kastark, fazendo que metade da força do exército se perdesse ... )
Veja que aqui que novamente, o príncipe (Robb, nesse caso),
não consegue evitar os efeitos do acaso, ou pelo menos diminuir estes efeitos,
por estar envolvido numa situação na qual tinha pouco controle. Por mais
competente que fosse a sua liderança, ainda assim falhou, seus aliados lhe
causaram destruição.
Uma das saídas é o príncipe ter pessoas de sua confiança a frente destes exércitos de aliados. E ainda assim, há de se vigiar bem este comandante, para que ele mesmo não fique forte demais e acabe achando que é possível ele mesmo ter o poder.
Voltando algumas centenas de anos no tempo, os exércitos de Júlio
César venceram várias campanhas e seus exércitos foram ficando cada vez mais fortes. Isso causou grande temor no senado romano, que tentou de várias formas impedir que César sequer retornasse a Roma, ou pelo menos que o fizesse sem seus homens. César se recusou e venceu a guerra civil, se tornando em 49 AC ditador de Roma.
Para César uma grande conquista, para o senado o aprendizado de que não se pode permitir que nenhum general acumule tanto poder em suas campanhas.
A mensagem principal é essa, o príncipe deve sempre que
possível, tomar atitudes que diminuam os efeitos do acaso, para não ser
prejudicado por variáveis que não controla.
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