A primeira grande questão é entender o que vem a ser
privacidade. Privacidade é a capacidade de uma pessoa ou de um grupo controlar
a disponibilidade de informação a seu respeito, omitindo certas informações e
liberando outras a sua conveniência. A privacidade pode ser vista como um
aspecto da segurança, ou seja, por trás da vontade de controlar uma informação,
existe um interesse em proteger algo.
Digamos que um sujeito qualquer ganhou na loteria, e porque
tem medo de ser roubado ou porque não quer chamar a atenção de credores ou
parentes indesejados, quer manter essa informação sob sigilo. Ou ainda, um
namorado que mantem conversas indesejadas com outras pessoas e não quer que sua
namorada descubra, ele pode até reclamar do direito a sua privacidade, mas no
fundo, está se protegendo de alguma forma. Mas também pode ser que não esteja fazendo
algo de errado, talvez ele apenas não confie seus assuntos privados a ninguém,
e por isso, entende que a privacidade é muito importante.
A arena pública é o espaço de acesso livre a todos, quem
torna uma informação publica, tem algum interesse em tornar aquilo público, ou
um desinteresse por sua ocultação. Quem se expõe publicamente tem que ter em
mente que acabara de aceitar os riscos de ser ouvido e julgado.
É pouco inteligente ou muito ingênuo, quem se expõe publicamente
e acha que não tem o direito de ser julgado pelo que disse. Isso acontece nas
redes quando um autor qualquer dá seus pitacos a respeito de algo, e age com
violência quando é contestado _ ainda que com bons e respeitosos argumentos.
Quem tem o mínimo de mentalidade democrática deve entender as implicações da
liberdade de expressão, seja para falar, seja para ouvir.
Daí temos uma oposição entre aquilo que é de esfera pública,
daquilo que é da esfera do privado, e um consequente conflito sobre quando algo
deve ser público e quando algo deve ser privado.
Um conceito muito evocado pelas sociedades democráticas é o
conceito de transparência. Imagina-se que o Estado, teoricamente visto como um
agente que é feito pelo povo para sua própria organização, tem o dever de prestar
contas de tudo o que faz para o povo, uma vez que este o mantem.
Porém, contudo, todavia, sabemos que muitos agentes do Estado
(esfera pública) têm suas próprias agendas e privatizam informações para seu
próprio interesse (alô alô Cunha). Alguns países mantem as chamadas agências de
inteligência, que com a justificativa do “Bem da Nação”, fuçam na vida de seus
cidadãos sem qualquer espécie de limite.
Para ficar no Brasil, montar uma comissão da verdade para
apurar as atrocidades do golpe militar, além de demorado, não ser de caráter
punitivo para os criminosos, ainda enfrentou dificuldades para levantar e
divulgar as informações. Se a informação é de interesse e poder do povo, porque
isso? Como atuam estas forças privadas dentro de nossas estruturas públicas?
O filósofo inglês Francis Bacon disse há muito que
informação é poder, e de fato, quanto mais sabemos sobre algo, melhor saberemos
como agir.
Pense num governo que detém grande parte da informação sobre
a vida de seus cidadãos, e como ele pode usar dessas informações para agir de
um modo ou de outro, apenas para perpetuar uma condição que lhe favoreça. Em
outras palavras, como uma esfera que teoricamente é pública, acumula e privatiza
tanta informação, tem a capacidade de manipular essa população toda.
Raramente aparece um Snowden para nos apontar isso, e ainda
assim, cada vez mais isso tem perdido a importância para as pessoas no geral.
Este post é uma reflexão
sobre uma das cartas que Zygmunt Bauman publicou
na revista italiana La Repubblica delle Donne
entre 2008 e 2009, que depois foram reunidas e editadas para o livro 44 Cartas ao Mundo Líquido Moderno (Zahar).
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